Seria o fim das Bets?

O futebol é, sem dúvidas, a paixão nacional. A cada fim de semana, milhões de brasileiros se reúnem em frente às telas ou nos estádios para torcer por seus clubes. Entretanto, nos últimos anos, tem sido cada vez mais comum ver bets estampadas nas camisas dos times, nos estádios e nas propagandas que permeiam as transmissões esportivas. Mas até que ponto essa associação entre clubes e empresas de apostas pode prejudicar a imagem dos clubes e a relação com o seu maior ativo, que é o seu torcedor.

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Foto: Reprodução/Freepik

No Brasil, historicamente, nunca houve uma cultura forte de apostas esportivas, diferente de países como Inglaterra e Estados Unidos, onde essa prática é mais consolidada. Nos últimos anos, no entanto, o cenário mudou. Com a legalização parcial das apostas online, surgiram diversas plataformas, tanto legais quanto ilegais, que têm se associado diretamente ao futebol.

Os patrocínios milionários oferecidos por essas empresas são atraentes para clubes que, muitas vezes, enfrentam dificuldades financeiras, principalmente em tempos de crise. Contudo, será que a busca por esse dinheiro rápido está levando em consideração os valores e a proposta de valor do clube?

Onde estão os valores institucionais de um clube?

Assim como qualquer empresa, um clube de futebol deveria ter seus pilares estratégicos bem definidos, aquilo que chamamos no mundo corporativo de missão, visão e valores. Esses elementos não são apenas ferramentas administrativas, mas o norte que guia as decisões do clube, tanto dentro quanto fora de campo. Eles moldam o comportamento da instituição, o relacionamento com os torcedores e as ações de marketing.

Com o advento dos clubes-empresa e das SAFs (Sociedades Anônimas do Futebol), essa responsabilidade se torna ainda maior, pois a gestão passa a ser mais corporativa, com maior foco em resultados. No entanto, ao observar a crescente adesão aos patrocínios de bets, a impressão que fica é que a estratégia financeira tem se sobreposto a qualquer consideração ética ou de branding, comprometendo a identidade e os valores que deveriam guiar essas instituições.

Um clube de futebol não é uma organização comum. Ele lida com a emoção e a fidelidade dos torcedores, que muitas vezes se identificam profundamente com a marca do clube, incorporando-a em suas próprias identidades. É justamente essa conexão emocional que precisa ser protegida. Ao aceitar patrocínios de empresas de apostas, os clubes estão realmente alinhando essas marcas com seus valores e com a missão que têm perante sua torcida? Ou estão simplesmente optando por um caminho mais fácil para resolver seus problemas financeiros imediatos?

A educação financeira em xeque

Um dos aspectos mais preocupantes dessa relação entre futebol e apostas é o impacto nas finanças pessoais dos torcedores. É verdade que as apostas podem ser vistas por muitos como uma forma de entretenimento, uma maneira de acrescentar emoção aos jogos. Contudo, no Brasil, onde a educação financeira é precária, há um risco significativo de que as apostas se tornem um problema sério para muitos indivíduos.

Muitos torcedores, movidos pela emoção do futebol, acabam utilizando parte de seus salários para apostar. Em um país com altos índices de endividamento e pouca instrução sobre como lidar com dinheiro, isso pode ter consequências desastrosas. O que era para ser uma simples diversão pode se transformar em vício e prejuízos financeiros, levando pessoas a situações de desespero.

Os clubes de futebol, ao associarem suas marcas a empresas de apostas, estão contribuindo direta ou indiretamente para esse problema. Estão se distanciando de seu papel social, que deveria ser o de promover valores como saúde, disciplina e bem-estar, para incentivar uma atividade que pode, em muitos casos, levar a uma degradação financeira. Será que esses clubes estão, de fato, pensando na missão que deveriam cumprir ou estão apenas interessados no dinheiro fácil que esses patrocínios trazem?

Branding em risco

No marketing, a construção e a gestão de uma marca são elementos fundamentais para o sucesso de qualquer organização. Isso não é diferente no caso dos clubes de futebol. A relação entre o clube e o torcedor vai muito além das vitórias em campo; envolve tradição, cultura, pertencimento e identidade. O branding de um clube é construído ao longo de anos, com ações que reforçam sua conexão com os torcedores e sua presença no cenário esportivo.

No entanto, essa relação pode ser comprometida quando o clube se associa a marcas que não compartilham dos mesmos valores ou que, de alguma forma, prejudicam sua reputação. As empresas de apostas, em muitos casos, são vistas com desconfiança, seja pela falta de regulamentação clara no Brasil, seja pelo impacto negativo que podem ter na vida financeira de seus usuários.

Ao associar-se a esses patrocinadores, os clubes correm o risco de alienar parte de sua base de torcedores, que podem enxergar essa parceria como uma traição aos valores tradicionais do esporte.

Dinheiro ou responsabilidade?

Não se pode negar que os patrocínios de empresas de apostas trazem uma injeção financeira considerável aos clubes. Muitos clubes enfrentam dificuldades para fechar suas contas no azul, especialmente em meio a um cenário econômico instável. No entanto, é preciso se questionar: até que ponto vale a pena sacrificar a identidade e os valores do clube por dinheiro?

O esporte é entretenimento, mas também é um espaço de formação de valores e cultura. Os clubes de futebol, como instituições que carregam um legado histórico e emocional, têm uma responsabilidade que vai além dos resultados financeiros. Eles devem ser cuidadosos ao escolher seus parceiros comerciais, assegurando que esses estejam alinhados com os valores que defendem.

O patrocínio de empresas de apostas pode parecer uma solução rápida para os problemas financeiros dos clubes, mas os riscos dessa associação são claros. A imagem do clube, sua relação com os torcedores e a responsabilidade social que deveria guiar suas ações estão em jogo. Dinheiro é importante, mas não pode ser o único fator a ser considerado nas decisões estratégicas de uma instituição que, acima de tudo, representa a paixão de milhões de pessoas.

Os clubes precisam avaliar se os patrocinadores que escolhem estão alinhados com sua proposta de valor, missão e visão de futuro. Afinal, a relação com o torcedor é o ativo mais valioso que um clube de futebol pode ter, e essa relação não deve ser comprometida por ganhos financeiros imediatos.

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