Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) – O Congresso deve entrar em ação para resolver o impasse entre o governo federal e as farmacêuticas Pfizer e Janssen, subsidiária da Johnson & Johnson, com uma emenda e um projeto de lei para que a União assuma a responsabilidade civil pela vacina, o que o presidente Jair Bolsonaro se recusa a fazer até agora.
De acordo com o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), depois de reunião com representantes das duas empresas e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), na manhã dessa segunda-feira, ficou claro que as empresas não abrem mão dessa cláusula para fechar contrato com o governo brasileiro.
A intenção dos senadores é aprovar, inicialmente, uma emenda apresentada por Randolfe à Medida Provisória 1026, que autoriza a compra sem licitação de vacinas, prevendo a responsabilidade da União, desde que o imunizante tenha autorização para uso emergencial da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
“Tanto a Pfizer quanto a Janssen precisam desse dispositivo”, disse o senador após a reunião. “A Pfizer está sendo aplicada hoje em 69 países. Essa cláusula foi assinada por todos esses países, segundo foi relatado pelos dirigentes das empresas. O Brasil não assumiu essa cláusula e por conta disso não comercializamos.”
Randolfe destacou que na América Latina apenas três países não aceitaram o dispositivo legal: além do Brasil, a Venezuela e a Argentina.
Depois da aprovação da MP, a intenção dos senadores, segundo Randolfe, é apresentar um projeto de lei para detalhar a responsabilização da União.
“Vamos abrir o diálogo com a Câmara. Ainda essa semana deve ser votada a MP 1026, e estamos rogando que a Câmara aprove a nossa emenda nessa MP que facilitará a entrada dessas empresas. Em paralelo será preparado um PL com todos os condicionantes que são necessários para entrada dessas empresas”, afirmou.
Em entrevista no início da tarde, o presidente do Senado afirmou ter “assimilado” as dificuldades dos laboratórios e vai conversar ainda nesta segunda-feira com o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, para tratar do assunto.
Pacheco confirmou que uma das alternativas em análise é fazer um ajuste via projeto de lei ou na MP que já tramita na Câmara para que a União faça a assunção dos riscos das duas vacinas. Outro caminho citado por ele seria o de permitir aos Estados adquirirem as vacinas dos dois laboratórios, desde que respeitando o plano nacional de imunização, coordenado pelo Ministério da Saúde.
“Precisamos da vacina, isso é inegável”, reforçou ele, ao ressalvar que no encontro os representantes das duas farmacêuticas não apresentaram um cronograma de entrega desses imunizantes.
A cláusula que gera a discórdia entre as empresas e o governo brasileiro é considerada padrão em contratos para venda de medicamentos ainda sem o registro final. Prevê que o governo que adquire os medicamentos assuma a responsabilidade por eventuais ações judiciais causadas por efeitos colaterais da vacina.
A Pfizer afirmou em nota que “ficou claro” ao longo das negociações com o governo que é necessária uma adequação legislativa para que o Brasil tenha um amplo acesso às vacinas disponíveis em todo o mundo, e que o encontro com os senadores teve esse objetivo.
“O encontro realizado com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o senador Randolfe Rodrigues teve como foco exclusivo falar sobre esses temas legislativos, afirmou a empresa. “A companhia mantém seu compromisso com o Brasil e por isso segue em tratativas somente junto ao governo federal”, acrescentou.
A vacina da Pfizer está sendo aplicada em dezenas de países –inclusive em Israel, que já vacinou mais da metade de sua população, e nos Estados Unidos, onde mais de 40 milhões de pessoas já foram vacinadas– sem apresentar efeitos colaterais graves até agora. O presidente Jair Bolsonaro, no entanto, até agora se recusou a aceitar o dispositivo.
Inicialmente, Bolsonaro chegou a dizer que iria propor um termo de responsabilidade a ser assinado pela pessoa que se vacinava aceitando eventuais riscos, mas depois de forte reação, a ideia foi abortada.
No domingo, o Ministério da Saúde divulgou mais uma nota acusando as duas empresas de “falta de flexibilidade” e informando que a Casa Civil foi acionada para orientar o ministério a como proceder nas negociações.
O secretário-executivo do ministério, Élcio Franco, afirmou que “as duas empresas fazem exigências que prejudicam os interesses do Brasil e cederam pouquíssimo nisso, ao contrário de outros fornecedores”.
Entre os pontos destacados pelo secretário estão a exigência de garantias de pagamento e a cláusula sobre efeitos colaterais.
(Reportagem adicional de Ricardo Brito)